seg, 25 de abril de 2011
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Ofício Circular nº 008/2011- GP

Florianópolis, 25 de abril de 2011.

Senhor Prefeito,

Com os meus cumprimentos, informo que a Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de Santa Catarina, tomou conhecimento de que alguns Municípios de Santa Catarina vêm exigindo o controle de jornada de seus Procuradores Municipais, Assessores Jurídicos ou Advogados Públicos.

Também, de que alguns Municípios têm remunerado os referidos advogados bem abaixo do valor mínimo estabelecido na Tabela de Honorários da OAB/SC, bem como não têm repassado a eles os valores relativos aos honorários de sucumbência decorrentes das ações em que os Municípios são partes.

Todavia, esta Entidade tem manifestado sua insurgência acerca das referidas situações, pois, são elas contrárias ao seu entendimento e posicionamento. Senão vejamos:

A Constituição Federal dispõe que “o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei” (art.133), que a cidadania e o valor social do trabalho são fundamentos do Estado Democrático de Direito (art. 1º.), que “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer” (art. 5º., VIII); que o trabalho e a sua remuneração de acordo com as normas da categoria são direitos sociais (art. 6º. E 7º.), e que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei” (art. 5º., II), entre outros.

A função de Procurador Municipal, Assessor Jurídico ou Advogado Público está condicionada à formação do profissional no curso de Direito e à sua inscrição nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil.

O art. 3º, § 1º, do Estatuto da OAB (Lei nº. 8.906/94) dispõe, de maneira expressa, que os Advogados Públicos exercem atividade de Advocacia, portanto, estão sujeitos a todas as normas estabelecidas naquele regramento específico, bem como contemplados pelos direitos dele decorrentes.

Por conseguinte, os advogados públicos municipais sujeitam-se ao duplo regime legal para disciplinar sua atuação, ou seja, à Lei nº 8.906/1994 e ao regime estabelecido na legislação do respectivo ente, de modo que, em sendo regime duplo nenhum dos dois regramentos pode ser preterido ou ignorado. Porém, naquilo que se considera prerrogativa da profissão, o Estatuto da Advocacia deve sempre prevalecer.

Considerando que os órgãos da Advocacia Pública Municipal devem ter independência técnica em relação aos administradores, deve-se atribuir a eles as autonomias administrativa, funcional, orçamentária e financeira.

Por conseguinte, e por força das peculiaridades inerentes ao exercício de suas funções, da necessidade de se assegurar sua completa autonomia profissional, e do interesse público de se garantir a sua independência, o advogado público municipal não pode ser submetido ao controle de jornada.

Diante da relevância das atribuições e da natureza estratégica dos serviços realizados pelos advogados públicos, tal controle traria incontáveis transtornos quanto à representatividade externa, inclusive judicial, do Município por parte dos profissionais, tais como a presença em audiências, tribunais de contas, a representação perante outros órgãos oficiais, que são exercidas, na maioria das vezes, fora do horário normal de expediente.

Haveria prejuízo inestimável para o cumprimento dos deveres profissionais submetê-los ao controle de jornada, bem como ataque direto às prerrogativas profissionais dos advogados públicos.

E em que pese os advogados públicos não possam ser confundidos com advogados empregados, tanto que o Regulamento Geral do Estatuto da OAB trata os advogados públicos e os advogados empregados em capítulos separados (art. 11, Seção III, e art. 9º - Seção II, respectivamente), não podem eles receber remuneração indigna e abaixo dos valores mínimos estabelecidos pelo seu órgão de classe para a remuneração de seus representados.

De acordo com a Resolução nº 003/2008 (Tabela de Honorários), a remuneração mínima mensal estabelecida pela OAB/SC para um advogado é de R$ 4.775,86, ou seja, bem além da realidade hoje vivenciada pela maioria dos advogados públicos municipais.

Ainda, de acordo com os arts. 22 e 23 do Estatuto, os honorários de sucumbência pertencem integralmente ao advogado, constituindo-se em direito autônomo e que integra o seu patrimônio, e não o do ente público.

O recebimento de honorários de sucumbência configura-se em direito e prerrogativa da profissão de advogado, assim também considerados os advogados públicos municipais, tudo legitimado pelo Estatuto da OAB.

Os honorários de sucumbência não estão classificados entre as receitas públicas, sejam elas tributárias ou não tributárias, descritas na Lei nº 4.320/64, que institui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços dos entes públicos, bem como nas demais normas que regulam a matéria, e não há qualquer outro fundamento legal para amparar a tese de que honorários constituam receita pública.

Os honorários também não podem ser vistos como fonte de receita dos Municípios, já que estes não podem se apropriar de valores que não lhes pertencem, uma vez que a sucumbência se trata de vantagem relativa à natureza do trabalho e da função, fruto de serviços efetivamente realizados e cujo titular do direito é expressamente definido em Lei Federal específica.

A verba sucumbencial é solvida integralmente pela parte perdedora no processo, e a Fazenda Pública não é titular da verba (a titularidade está estabelecida nos arts. 22 e 23 do Estatuto da OAB), haja vista que o valor não é desembolsado de seus cofres e nem adveio do Estado, sob qualquer aspecto, tampouco decorre do seu poder de tributar.

Ou seja: o Município não desembolsa qualquer valor para o pagamento dos honorários de sucumbência dos advogados públicos, pois, eles são pagos pela parte vencida na ação. E como os honorários de sucumbência não podem ser confundidos com o salário dos servidores, não há uso de dinheiro público para pagamento da verba.

Não há ilegalidade ou imoralidade no pagamento dos honorários de sucumbência aos advogados públicos, já que seu pagamento deve ser realizado por força de lei, como prerrogativa da profissão e relativamente a serviços efetivamente realizados.

Também não há situações previstas em lei ou na Constituição Federal que proíbam ou limitem expressamente o pagamento de honorários de sucumbência aos advogados públicos municipais. Além disso, por regra de hermenêutica, não pode ser dada interpretação extensiva a normas restritivas de direitos, sob pena de ficarem maculadas as regras constitucionais já referidas, que se constituem direitos e garantias fundamentais explícitos e inafastáveis da Lei Maior.

O pagamento da verba também não é uma faculdade ou liberalidade do administrador Municipal, mas uma obrigação legal.

Não há danos ao patrimônio público, pois, como já dito, o valor dos honorários de sucumbência é pago pelo contribuinte, e não pelo Município, que recebe integralmente o valor da sua receita cobrada judicialmente.

Privar os Procuradores do recebimento dos honorários de sucumbência e de uma remuneração digna pelo seu trabalho, além de ser ilegal, é uma afronta ao princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana.

A doutrina e a jurisprudência pátrias vêm se consolidando a respeito da matéria e se posicionando quanto à legalidade do pagamento da sucumbência aos advogados públicos.

É entendimento do STF e do STJ que os honorários advocatícios revestem-se de natureza alimentar e, na maioria dos casos, já integram os proventos da categoria, limitando-se as discussões nos tempos atuais exclusivamente ao estabelecimento do teto.

O Conselho Federal e a Seção de Santa Catarina da Ordem dos Advogados do Brasil, assim como o seu Tribunal de Ética, em diversas ocasiões manifestaram-se no sentido de que os advogados públicos têm direito de perceber honorários de sucumbência ou decorrentes de acordos extrajudiciais.

A Associação Nacional dos Procuradores Municipais tem se manifestado expressa e frequentemente contra decisões que interfiram na destinação dos honorários advocatícios dos advogados públicos, bem como no sentido de que os honorários de sucumbência pertencem aos procuradores municipais, mobilizando-se nacionalmente em defesa da causa.

Advogados e procuradores de diversos municípios do país recebem tais verbas há décadas, como, por exemplo, municípios do Estado de São Paulo (cujos procuradores recebem honorários há mais de 30 anos) e o Município de Curitiba/PR (cujos procuradores recebem honorários de sucumbência desde 1960), com o aval do Judiciário, inclusive dos Tribunais Superiores, que têm confirmado entendimento quanto à legalidade dos respectivos pagamentos.

O Órgão Especial do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, nos autos da ADIN nº 2007.029003-3, em face da Lei Municipal nº 1.448/95, do Município de Balneário Camboriú, decidiu por unanimidade pela legalidade do pagamento dos honorários de sucumbência aos procuradores municipais.

O Pleno do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, nos autos da ADIN nº 2005.037453-9, em face da Lei Municipal nº. 4.714/1995, do Município de Florianópolis, decidiu pela legalidade do pagamento da verba aos procuradores municipais, pela inexistência de afronta aos princípios da moralidade administrativa e da impessoalidade, pela importância de estimular a eficiência, a dedicação e o empenho dos procuradores nas demandas em que atuem na defesa dos interesses do Município, e pela possibilidade do ente público disciplinar o regime jurídico dos seus servidores, inclusive através da concessão de vantagens (dentre elas o pagamento de honorários advocatícios).

A Primeira Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, nos autos do Agravo de Instrumento nº 2007.063950-3, referente à declaração incidental de inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 622/2001, do Município de Bombinhas, por votação unânime deu provimento ao recurso para reconhecer que, existindo lei do ente federativo que determine que tais valores sejam destinados aos procuradores, nada obsta ao pagamento dos honorários de sucumbência aos advogados públicos municipais;

Além disso, os Municípios podem legislar acerca de questões de interesse local, nos limites da Constituição Federal. Nesse diapasão, em diversos Municípios catarinenses já há leis disciplinando o pagamento de honorários de sucumbência aos seus procuradores, corroborando o já disposto no Estatuto da OAB.

Destarte, os argumentos jurídicos apresentados ratificam a interpretação defendida pela instituição no sentido de que os honorários de sucumbência devem ser destinados aos advogados públicos.

A Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional de Santa Catarina, já promoveu Nota de Desagravo em favor dos Procuradores Municipais em decorrência das ações já ajuizadas pelo Ministério Público Estadual contra o recebimento dos honorários de sucumbência e tem se engajado nas lutas da categoria neste sentido, inclusive ingressando como “Amicus curiae” em processos judiciais e extrajudiciais existentes para defender os seus interesses.

Assim, a Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de Santa Catarina, no uso de suas prerrogativas e com base nos fundamentos acima transcritos, bem como no intuito de possibilitar aos advogados públicos municipais melhores condições de trabalho, recomenda a Vossa Excelência:

a) A abstenção da prática de controle de jornada dos advogados públicos municipais, se houver;

b) A adequação da remuneração dos advogados públicos municipais respeitando-se pelo menos aos valores mínimos estabelecidos no Estatuto da OAB, ou seja, R 4.775.86, caso os valores atualmente pagos sejam inferiores;

c) O repasse dos honorários de sucumbência aos advogados públicos nos processos em que o Município for parte, caso ainda não venham sendo repassados; e

d) Caso ainda não haja, a elaboração de lei municipal regulamentando o pagamento dos honorários de sucumbência, observando-se que a distribuição deve se dar igualmente entre os procuradores, que os valores deverão passar por conta pública ou fundo municipal, e que o teto remuneratório deverá respeitar os limites da Constituição Federal.

Ao ensejo, renovo protestos de elevada e distinta consideração.

Atenciosamente,

Paulo Roberto de Borba

Presidente da OAB/SC

Referências: OAB/SC
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